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Angélica Transformou o luto em Arte

Ela perdeu pai e mãe na covid e os ressuscitou pela arte

Reportagem e texto: Pitágoras Bom Pastor

Angélica Santos, do  Ipiranga, caiçara tradicional de Caraguatatuba,  perdeu 9 “primos” para a Covid . Mas a perda mais dolorosa foi de seu pai, Anselmo 7 cordas, e sua mãe Rosinha ou Nenê. Para amenizar a dor, descobriu-se capaz de transformar troncos e restos de árvores em linda esculturas de madeira. Tornou-se de repente, uma  respeitada artista na cidade, onde sua família  é das mais tradicionais . Seu avô materno, Tião Izidoro, era benzedor. Ele criou e liderou a festa de São Pedro Pescador, da Praia do Camaroeiro. O paterno, Chico Vitorino era músico e artesão na madeira, especialista no fabrico de canoas.

 A taxa de mortalidade do bairro,  foi uma das mais altas de Caraguatatuba. Talvez devido ao acesso de turista na sua praia , o Camaroeiro, onde há o mercado de peixes. Nesse vilarejo caiçara, todos se tratam como parentes. Os mais velhos são como tios, os da mesma idade “brimos”. As famílias são entrelaçadas por consaguinidade e pelo amor ao mar e à pesca.  

  A mãe da Angélica, Rosa dos Santos , ou dona Nenê,  foi a primeira que morreu. Para fugir da tristeza ela conta como começou a trabalhar: – “  Com a morte de minha mãe em 23 de agosto de 2020 sofremos muito. Superamos a dor, com a ajuda dos poetas do Fieira de Timbopeva, liderados pelo Pita>  Fizemos do seu enterro, um evento,  com poesia e barcos no mar. Suas cinzas foram jogadas no mar.  Em dezembro de 2020 , fiz minha primeira escultura. Uma  tartaruga , – feita de  casca do caule de um abacateiro morto-  que  encontrei.  Nunca estudei  e nem havia feito artesanato antes ( coisa que é tradição na minha  família de ambos os lados). Fui  foi dobrando aquilo e dando -lhe forma , até nascer a  tartaruga. As patas e os olhos ela fiz com resto de cordas descartada pelos pescadores.

Tartaruga feita de casca de caule de abacateiro morto e cordas descartadas

A Arte ressuscita  os parentes mortos

“Deus está presente em tudo. O universo e tudo que há nele, -incluindo o homem-, são um fluxo de vida infinito. Nada morre ou nasce de verdade  mas tudo é uma  continua transformação de formas” . -Poeta Jalal Al Din Rumi

 

Se a Covid tirou da vida da Angélica tantos parentes e amigos, principalmente seus amados pais, o evento em que se transformou o enterro de  sua mãe, transformou também a sua visão sobre a morte.Ela percebeu que tanto seus pais como seus avós, continuam vivos nela , nos irmãos e seus descendente, através  no amor, da genética, e e agora da arte. Como diz o poeta Rumi, ” Não há morte no amor“.

Vô chico e Vó Zulmira, obra em palha de coqueiro

Logo, em razão dessa nova visão, depois da tartaruga e de um peixe ,  trouxe à vida através da arte,  seu avô paterno, o músico, “fazedô” de canoa e pescador, Chico Vitorino. Chico,  junto com seu filho Anselmo e seu irmão Antônio, foram os pioneiros tocadores de choro da cidade ( antes eles tocavam fandango). Depois ressuscitou sua avó materna Zulmira. Eles são agora  esculturas em madeira

 

Uma Família Peixe  e ameaçada de perder suas  terras ancestrais

Mostrei para Angélica uma poesia que fiz para os Paes, -pescadores do Porto Novo-,  dizendo  que eles não sabem se são peixe gente ou gente peixe . Afinal, os pescadores vivem numa relação simbiótica com o mar e com mangue. Surfista, pescadora ( embora não trabalhe com isso), canoeira, etc.. ela não teve dúvida  : “ Sou mais  peixe que gente” .  Explicou:

Sua alimentação é baseada e de peixe e frutos. Na sua casa e na sua família, – exceto pelo estranho gosto do seu tio paterno, Pedro Carapau, que só come carne e não come  frutos do mar-, o peixe é a comida principal e o arroz feijão são a mistura.

Angelica no seu quintal na praia do Camaroeiro

Angélica  nasceu com o pé na areia, na casa situada quase na costeira, que sua família materna habita há mais de 100 ano. Esta terra  está ameaçada por agora, uma famíia   de São Paulo que lhes moveu uma ação possessória,   Nesta terra,- que o poeta caiçara Djalma Barra Seca,  batizou  de Quintal do Tião Izidoro e onde seu tio, o mestre caiçara Caco tem uma Marina- ,  e que aconteciam os  fandangos, seu avô, Tião ,  principalmente,  a mais tradicional festa junina de Caraguatatuba de todos o tempos, a festa de São Pedro Pescador.

       Recusada na Feira de Artesanato Municipal

 Angélica se profissionalizou, adquirindo ferramentas para fazer de sua arte uma fonte renda. Foi se inscrever na Feira de Artesanato Municipal de Caraguatatuba e a comissão que decide quem é o ou não artista , a recusou. A Cancioneiro foi atrás do assunto e acabou descobrindo que essa comissão , é formada por artesãos talvez interessados em manter uma reserva de mercado .

Numa  outra ocasião , mesmo autorizada pela Secretária de Turismo  a expor no Mercado de Peixes,-  (instalado no Quintal do Tião Izidoro)- , ela foi expulsa pelo presidente da Associação de vendedores do mercado . Ele,- cujo dever é apenas cuidar do interesse dos vendedores-, se arrogou em  dono do espaço público afrontando as ordens superiores.

A casa caiçara dos avos de Angélica Tiao Izidoro e Zulmira Praia Camaoreiro Caraguá
A casa caiçara dos avos de Angélica Tiao Izidoro e Zulmira Praia Camaoreiro Caraguá

Leia também sobre o Camaroeiro  A História do Fandango do Camaroeiro, o bairro mais festeiro de Caraguatatuba

Numa  outra feita , mesmo autorizada pela Secretária de Turismo  a expor no Mercado de Peixes,-  (instalado no Quintal do Tião Izidoro)- , ela foi expulsa pelo presidente da Associação de vendedores do mercado . Ele,- cujo dever é apenas cuidar do interesse dos vendedores-, se arrogou em  dono do espaço público afrontando as ordens superiores.

A opinião de outros artistas 

Para a   premiada  artista plástica, Marisa Di Giaimo , 76 anos de idade e mais de 50 de arte,   a obra de Angélica não é de fato  artesanato É ARTE PURA. Ela concorda que as peças   da Angélica dos Izidoro  dialogam com a obra de Frans Krajceberg. Portanto é uma obra artística-ecológica, com profundo viés de educação ambiental e que ainda  é memorialista da cultura do  povo caiçara, assim  como o é a obra de Arnaldo Passos .

Marisa Di Gia,o artista plástica

Por sua vez, Arnaldo Passos, caiçara e renomado artista plástico Naiif,  concorda com Marisa sobre as qualidade do trabalho da  Angélica. Ele diz : “A Angélica    é neta e bisneta de fazedores  de canoa. Seu pai também era artesão .. Angélica tem tradição e talento natural”

Arnaldo Passos e Angélica

Tradição Familiar no artesanato

Angélica conta que seu pai fazia canoas em miniatura. “Inclusive ,pouco antes de sua  morte, estava  fazendo um barco em miniatura  , que dizia ser para uma viagem. A morte foi a sua viagem.”- disse ela .

Anselmo  pai da Angélica

Ele  morreu devido ao  uso abusivo do tratamento precoce contra Covid. Ele tomou muita Cloroquina que dilatou seu coração e a Ivermectina ( o mesmo Ivomec de boi).

O  tio paterno da Angélica, Antônio Cortez, o  Baguinha, é um dos principais mestres no fabrico da  canoa no litoral norte, e também ótimo artesão. Com toda essa genética, ficou fácil pra ela tornar se a grande artista que é

Baguinha é melhor fazedor de canoa de Caraguatatuba

SERVIÇO : Quem quiser conhecer as obras de Angélica e adquiri-las, pode contatá-la pelo whatsapp 12 98101-3269

      Vejam mais fotos das obras de Angélica aqui

 

VEJA MAIS SOBRE A FAMILIA

No vÍdeo acima, Noah, de 5 anos, neto de Angélica, aprende as artes da pesca com seu tio avô, Xelé, irmão caçula da artista.

 

Um Poema  pros  caiçaras pescadores 

Esta poesia , embora feita com o  nome da família Paes, serve para todos os caiçaras nascidos na beira mar, e portanto pescadores:

PAES É PEIXE GENTE OU GENTE PEIXE?

Pitágoras Bom Pastor Medeiros

Esses Paes o que são ?
São peixes se achando gente?
Ou gente que peixe estão?

Sílvia Paes foi pra Minas
Virou peixe de ribeira
Wilson é peixe espada
Pedro é o pai dessa Peixeira.

Irene é dona Maria ,
Ou Rainha Iemanjá,
Os Paes fazem pescaria
Em toda coisa que há.

Pescam paz, pescam amor,
Pescam amizade e carinho,
Tudo peixe e pescador
Nascidos no mesmo ninho.

Filhos do Rio e do Mar
Nadam invés de andar
Seguem no mesmo caminho
Desde o tempo milenar

 

*Esse poema acima é baseado num conto Zen que é assim:

Kung Fu  Tsu , ou Confúcio, passeava com um discípulo ás margens de uma lagoa e falou para seu aluno:

– Olha como os peixes estão felizes.

E o discípulo respondeu:

Mestre, o senhor não é peixe, como pode saber que eles estão felizes?

Kung Tzu respondeu:

– Se você não é eu, como sabe que eu não sou peixe?

Todo caiçara nascido na beira da agua, seja do mar, do rio ou da ilha é peixe em forma de gente.

 

 

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Pitagoras Bom Pastor

Pitágoras Bom Pastor de Medeiros, é formado em direito e pós graduado em jornalismo digital

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Um Comentário

  1. Angelica, que seu dom permaneça enraizado em sua sabedoria caiçara…
    Nos mostrando a sensibilidade de sua criação autêntica…
    Parabéns e muito sucesso!!

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